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Pode entrar menina

Marlene / Assunção

 

 

“Uma menina bonita. Uma gordinha com carinha de fome. De olhar suave, mas atormentado pela precisão. Assim era ela quando chegou pedinte à minha porta, aqui no Assunção, há muito tempo atrás. Ela, uma criança com onze anos incompletos. Eu, uma professora jovem vinda do interior com um marido e dois filhos pequenos. Frente a frente: duas mulheres, duas migrantes. Não sei dizer se hoje faria o mesmo. Os tempos são outros, os medos são maiores. Tudo mudou. Aquela São Bernardo tinha pouca gente. Eram pessoas como eu, vinda de outros lugares, alguns muito distantes. Naquele dia, naquela cidade que também era nova para mim, ouvi a pequena garota repetir insistentemente, desde a rua: - Posso ajudar a senhora? - Posso ajudar a senhora em alguma coisa? - Por favor. Posso ajudar? Quanta dor no coração de uma mãe ao ver uma criança sofrendo nas incertezas da rua. Exposta à violência. Exposta ao engano. Que mãe não sofre ao pensar que pode ser seu filho ou sua filha aquela que, como essa menina na minha porta, devia ganhar a vida diariamente de maneira tão difícil. Que vida terrível a nossa se não podemos ser capazes de olhar com carinho para rostinhos como esses acostumados desde tão cedo às lágrimas e às privações. São Bernardo foi uma escola para mim e um lugar onde duas famílias, a minha e a daquela pequena garota, coincidiram para compartilhar uma história. Aquela garotinha cuidou dos meus filhos e mesmo tão menina assumia com responsabilidade suas tarefas e obrigações. Mas era uma menina, e com tal, também tinha sonhos. Quem sabe viajar. Quem sabe conhecer pessoas novas. Andar por entre castelos de príncipes e princesas. Quem sabe correr até cair. Rir até o limite das suas forças. Ou talvez simplesmente brincar sem o apuro de voltar a ser adulta naquele mesmo dia. Essa menina que entrou na minha casa ficou conosco alguns anos. Depois foi embora, mas nunca perdemos o contato. Eu, aposentada, não penso sair jamais desta cidade que me recebeu com tanto carinho e que, depois de tantos anos, ainda observo com curiosidade, emoção e amor. Ela, a pequena garotinha desta minha história, já é adulta. Cresceu trabalhando e com esforço construiu uma família. O tempo passou, mas deixou algumas coisas. Dos sonhos daquela criança gordinha que dançava com as vassouras e que fechava os olhos pensando em fadas e castelos, foi preservado o compromisso de fazer que sua filha tenha a vida que ela não pôde ter. - Uma viagem para conhecer o pateta? É isso mesmo? – Perguntei. Sim, respondeu ela. É um presente para minha filha, e para aquele pedacinho de mim, que ainda vive, e que nunca acreditou em impossíveis”.

 

em São Bernardo do Campo

DA PARTICIPAÇÃO

PROTAGONISTAS

Uma cidade cada vez melhor de se viver

PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE SÃO BERNARDO DO CAMPO

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